sábado, 30 de outubro de 2010

Aumento da burocracia atrapalha a vida do contribuinte

Criada sob a necessidade momentânea de amenizar os efeitos das denúncias de quebra do sigilo fiscal na Receita Federal, a Medida Provisória nº 507, editada em 5 de outubro de 2010 e já sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, está causando alvoroço entre os contadores e advogados. Em vigor desde o dia seguinte a sua publicação, a medida foi regulamentada pela portaria RFB 1860. 


A principal polêmica da norma é o Artigo 5º (leia abaixo) que obriga esses profissionais a fazerem procuração por instrumento público para atuar nos processos de seus clientes. Com a preocupação de preservar a idoneidade da instituição e dar mais segurança ao trabalho do seu servidor, o governo aumentou a burocracia e, com isso, atrapalhou a vida do contribuinte. 



Os contadores reclamam do aumento da dificuldade nos procedimentos na Receita Federal. De acordo com Marcone Hahan de Souza, vice-presidente do Sindicato dos Contabilistas de Porto Alegre, a categoria terá que se posicionar firmemente contra a exigência. “Se alguém errou, que seja punido. Os contabilistas não podem ser penalizados por um erro cometido por outros”, afirma. Segundo Souza, o sindicato irá enviar ofícios convocando todas as entidades de nível estadual para mobilização contra a MP. Adaptar-se às novas regras não está entre as propostas do sindicato. Entre as soluções apontadas pelo vice-presidente estão a tentativa de diálogo com o governo para conscientização e sensibilização do presidente Lula ao tema, e, em última instância, o apelo à Justiça Federal. 



A medida desagradou também aos advogados, que já estão articulados para entrar com uma ação judicial. Mobilizados através da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), eles contestam o fato de a norma tornar obrigatória a apresentação de uma procuração por instrumento público para que advogados representem seus clientes nas questões envolvendo a Receita Federal. Segundo a entidade, a medida impede o protocolo de defesas administrativas e recursos, além da vista de processos, a obtenção de certidões fiscais, o substabelecimento a advogados do próprio escritório e de outras localidades na Receita Federal. 



De acordo com Cláudio Lamacchia, presidente da OAB/RS, a decisão tomada nacionalmente com apoio das entidades regionais age em defesa das prerrogativas da categoria. “Através de uma decisão simplista, o executivo transfere para os advogados o ônus de corrigir eventuais quebras de sigilo”, afirma. 



Além disso, Lamachia entende que a medida contraria a Lei 8.906, que rege o estatuto da advocacia e faculta ao advogado a utilização de procuração e trabalho processual. No momento, a entidade incita os advogados gaúchos a manifestarem via e-mail o descontentamento aos políticos, e aguarda os desdobramentos do caso, que devem ocorrer após as eleições.


Texto da Medida Provisória 507 – Art. 5o


Somente por instrumento público específico, o contribuinte poderá conferir  poderes a terceiros para, em seu nome, praticar atos perante órgão da administração pública que impliquem fornecimento de dado protegido pelo sigilo fiscal, vedado o substabelecimento por instrumento particular.


Para muitos profissionais da Contabilidade, a medida que deveria ser uma solução criou um grande problema. É o caso de Luciano Biehl, da Aprove, que está indignado com a necessidade de procuração pública. “É inconcebível que uma situação de ordem política localizada em outro estado penalize todos os usuários, criando uma imensa burocracia”, afirma. Para ele, a medida atrapalha o trabalho do dia a dia do contabilista. Ele destaca ainda que a medida do governo não impedirá a ação dos estelionatários, que continuarão burlando a lei mesmo deste novo jeito que ela foi reformulada.

Um dos principais pontos negativos da MP 507, segundo ele, é que os clientes têm uma série de demandas e não têm tempo para ir até cartórios ou até a Receita fazer a procuração. “Estão querendo criar um embaraço maior para que se evitem fraudes, e estão praticamente inviabilizando os serviços”, protesta.

Ele relembra que, no passado, quando se recebia uma procuração, a nominata dava o poder a quatro ou cinco profissionais de um mesmo escritório executarem ações, fato que fica impossibilitado perante a nova lei. As consequências estão respingando nos clientes. Biehl conta que já perdeu inúmeros agendamentos na Receita em função da falta de procuração. “Isso vai empurrando a resolução de problemas para 20 a 30 dias”, afirma.  Biehl diz que está ocorrendo a diminuição de atendimentos dado o aumento da burocracia.

O técnico contábil Darlan Eferson Eduardi, da Eduardi Contabilidade, também registrou reclamações em relação à morosidade da recepção da Receita. Eduardi reclamou da demora para regularização do CNPJ da empresa de clientes. “A demora é exorbitante. Antes, ocorria em dois a cinco dias. Agora, está demorando no mínimo um mês”, afirma. Segundo ele, a principal demora está nas alterações cadastrais, e o fato pode estar associado ao déficit de funcionários.

Segundo Eduardi, os clientes estão sendo prejudicados, pois algumas empresas estão com cadastros desativados e o contador, perante o cliente, parece que está desinteressado, quando na verdade, trata-se de um problema burocrático da Receita. Ao ser procurada para esclarecer a situação, a Receita informou que está providenciando os encaminhamentos necessários para o caso. 

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