segunda-feira, 28 de novembro de 2011

Reflexões sobre o novo emprego dos contadores

A pergunta não quer se calar: Haverá profissionais qualificados no mercado para atender as novas demandas? Já há quem reclame da falta e da dificuldade de contratar, principalmente quem conheça em grau razoável o IFRS e esteja consoante aos reflexos fiscais da já não tão nova legislação contábil. Uma das queixas atualmente é a falta de profissionais para atender empresas que optam lucro real. Mas além de quem emprega também tenho ouvido as lamentações de quem procura por emprego e algumas dessas lamentações são no mínimo preocupantes. É um fenômeno social que não pode ser ignorado.

Muitos colegas se queixam que não conseguem aplicar os conhecimentos adquiridos nos cursos de atualização e aperfeiçoamento e que em muitas empresas, principalmente os escritórios de contabilidade, há carência de estrutura e capacidade técnica das lideranças internas. Talvez a culpa seja da velha cultura de dono do negócio que é muito presente nos escritórios de contabilidade. Ao contrário do que se vê por ai, uma grande massa de fato se preocupa com o esmero da profissão, mas não se tem visto tantos patrões nos banquinhos das escolas. A preocupação com a condução administrativa dos escritórios de contabilidade tem afastado muitos empresários e gestores dos cursos de atualização e capacitação técnica. A educação continuada tem ficado de lado em função da gestão dos lucros de um negócio como outro qualquer. Para os contadores que procuram emprego, trabalhar em empresas assim significa colocar a carreira em risco. Daí vem uma pergunta que muitos me fazem: “Devo assinar o balanço no lugar do meu patrão?”. A resposta evidentemente é não.

Não quero demonizar ninguém, mas tendo em vista essa cultura de dono do negócio tão disseminada nos escritórios de contabilidade, não há por que o contador empregado nesses escritórios assinar o balanço no lugar de seus patrões. Mas este não é o principal motivo para não assinar o balanço. A razão essencial para isto é que o empregado não pode arcar com os riscos do negócio e frente legislação e a justiça do trabalho, assinar o balanço no lugar do patrão pode ser ilegal. Mesmo que o empregado coloque a sua força intelectual e pessoal no trabalho, ele quase sempre não estará na condição de mandatário tal como é a condição do dono do escritório. O dono do escritório é aquele que apropria dos resultados econômicos e sociais da empresa e está sujeito aos riscos do negócio como qualquer outro empresário. É ele que interage junto aos clientes e cabe também a ele diversas decisões visando a preservação da carteira de clientes bem como dos interesses econômico-fiscais destes. Face a esta situação a interação do contador empregado fica limitada no ambiente externo da empresa de contabilidade. Por força de lei, ver artigo 2º e parágrafo único do artigo 3º da C.L.T. – Consolidação das Leis do Trabalho e o inciso III do artigo 932 do Código Civil. O contador empregado está subordinado juridicamente ao dono do negócio como qualquer outro trabalhador empregado. Essa subordinação também se dá por forças socioambientais e forçar o empregado à assinatura do balanço é sem dúvida um abuso de poder econômico e social. Mas também não podemos deixar de lado uma segunda pergunta: E quando houver dano? Basta aos envolvidos apresentar a prova das autorias dos danos e é justamente ai que está um drama. Quem assinou o balanço em um primeiro momento seria o autor do dano e seria o primeiro a ser chamado para as responsabilidades. Se no dia-a-dia apenas executou tarefas menores e rotineiras que lhe foram imputadas e não participou de decisões ou orientações estratégicas para a condução de um negócio empresarial ou de qualquer outro tipo de entidade, não deve assinar o balanço. A assinatura do balanço pressupõe a autoria dos registros de fatos e atos contábeis combinados com os atos da administração de uma entidade e sendo assim o autor pode acabar por responder pelos danos, até que se prove quem de fato é o verdadeiro mandatário e o dono dos atos que originaram os possíveis danos. Dependendo da situação e ai vai da imaginação de cada um, seria o mesmo que ser “laranja”. Pelo se que se tem tido notícia, há que se levar em conta também o aspecto do tratamento dado aos contadores de uma forma geral pela justiça e pelas administrações fazendárias em caso de fiscalização e sabemos notoriamente que o tratamento não é bom. No contexto da responsabilidade corporativa ou socioambiental, é dever da empresa de contabilidade assim como em qualquer outra, garantir a segurança dos empregados, não só a física, mas também a jurídica, vide Melo Neto (2001).

No mercado de trabalho rumina-se a premissa de que se alguém foi contratado pelas qualidades e pela capacidade técnica que assine então o balanço das empresas que cuida nos escritórios de contabilidade. Ora, tal premissa é mera desculpa para alguns empregadores fugirem das responsabilidades e não serve nem de argumento frente ao atual cenário na época em que vivemos. A figura do contador empresário não deve se confundir com a de contador empregado. O primeiro detém o poder diretivo como o “dono ou proprietário” do negócio e o segundo é mero dependente do primeiro e juridicamente subordinado. Embora o contador empregado possa ser registrado em carteira de trabalho como contador ou mesmo auxiliar, analista, assistente etc., na prática não passa mesmo de um mero auxiliar na condução da rotina administrativa na maioria das empresas ou escritórios de contabilidade. É um mero coadjuvante. Vejam aqui também a primazia da essência sobre a forma.

A qualificação e a educação profissional continuada é uma obrigação para o contador seja ele empregado ou empregador. A aplicação do conhecimento é regra para o crescimento social e econômico de qualquer profissional. Uma empresa é uma reunião de interesses e se esses interesses não forem comuns não há por que fazer parte dela. O contador quando empregado não deve se furtar às suas responsabilidades até por que é perfeitamente aceitável do ponto de vista jurídico que este possa responder por dano em conjunto com o empregador, desde que o risco do negócio não seja transferido ao empregado. Todavia cabe ao contador que procura emprego a virtude do bom senso e escolher muito bem, um lugar onde a cultura e os objetivos socioambientais e econômicos sejam semelhantes aos seus, mas que se pautem pelos princípios éticos e morais para não cair em desgraça.

Autor: Marcos Aurélio Canavezzi

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